Na nossa escola, coach-professores trabalham como mentores e supervisores de novos coaches. Neste trabalho temos notado que alguns coaches quando encontram dificuldades com um cliente, imputam nele a responsabilidade e sem muita reflexão indicam psicoterapia. Será que esse realmente é o caso? Nem sempre. Na verdade, muitas vezes, o problema é o coach que está sendo pouco habilidoso.
É verdade que os problemas de saúde mental afetam cada vez mais pessoas ao longo dos anos. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), até 2020, a estimativa é que a depressão e os transtornos de ansiedade competirão com os problemas cardiovasculares como o principal ônus da saúde mundial.
Mas é verdade também que a indicação para psicoterapia não pode se basear num único sintoma. Contudo, há muitos coaches que quando o cliente, por exemplo, não cumpre seu plano de ação, o que é um sintoma, imediatamente recomendam a psicoterapia.
Provavelmente por depositarem uma fé excessiva nas metodologias e ferramentas de coaching que aprenderam se agarram a elas, e perdem de vista a confiança no coachee. Como a confiança é uma via de mão dupla não dá para confiar em quem não confia em mim , ela se perde nos dois sentidos. Coach não confia que o coachee vá ter as respostas ou realizar o combinado, nem o coachee confia no coach que este não tem uma “agenda” para ele.
Consequência: Coach não se aprofunda no tema da sessão e a discussão fica superficial. Esta falta de aprofundamento faz com que a questão trazida pareça simples. Sendo simples coach acha que sabe a solução e começa a conduzir a sessão e o cliente, ou seja, senta no banco do motorista e começa a “empurrar” o coachee para onde acha que ele deve ir, manipulando com perguntas até o coachee chegar no plano de ação que ele, coach, acha adequado. Resultado? Na próxima sessão o cliente não fez nada ou nem comparece.
É importante notar que o coachee pode não sentir a manipulação, mas como bom ser humano resistirá, pois sente que está sendo levado para um lugar onde não quer estar. Aí, quando ele começa a não cumprir as tarefas acordadas, a chegar atrasado e/ou faltar, a ter crenças irremovíveis etc. O coach começa a achar que o coachee precisa de terapia.
Mas, na verdade, o sinal de a é para o coach! Ele precisa parar e rever, numa atitude “egoless”, as suas metodologias, sua forma de se posicionar, como está utilizando as ferramentas e se é ele que está conduzindo a sessão. Provavelmente, ao fazer essa reflexão verá que o problema é ele e conseguirá enxergar novas formas de ajudar o cliente atingir os seus objetivos.
Agora, quais são os sintomas que indicam a real necessidade de terapia? Se o Coach nota que o coachee se auto-avalia frequentemente de forma muito desvalorizada, se ele dá uma importância exagerada à opinião dos outros, se não assume nenhuma responsabilidade e aponta sempre causas externas, se não é capaz de pensar criticamente no que diz respeito as suas suposições e crenças, se demonstra sofrimento devido a alguma atitude que ele faz repetitivamente, se apresenta questões de adicção como alcoolismo, se fala em suicídio, aí sim é o caso de indicar a psicanálise ou psicoterapia.
Contudo, é preciso fazer ainda outra distinção importante. Questões relativas a psicoterapia e necessidade de tratamento. Um cliente desavisado pode trazer para uma sessão um assunto que seria melhor cuidado na psicoterapia, mas isto não quer dizer que ele precisa de tratamento. Por exemplo: Ele pode trazer como tema o relacionamento dele com uma subordinada na hierarquia. E, no meio da sessão, ele diz: “Ela me lembra muito a minha mãe, não sei porquê“. Um coach leviano pode começar a discutir o que a subordinada faz que te lembra a mãe e entrar num campo que ele não tem permissão para trabalhar – mesmo que tenha estudado psicologia e tenha consultório de terapeuta aberto, é bom lembrar. Neste caso o cliente trouxe a questão para o campo da psicologia, mas não está apresentando sintoma de necessidade de tratamento.
Mas, como fazer quando de fato é necessário indicar a psicoterapia? Primeiro é sempre bom discutir o caso com um supervisor – mentor para avaliar qual a melhor forma de abordar a questão para não “ofender” o coachee ou fazer com que ele crie resistência. A partir daí, é preciso colocar em prática algumas etapas durante as sessões. A primeira, como a própria ICF orienta, é adotar uma linguagem direta com um tom calmo e positivo, expressando a preocupação com o cliente e apontando comportamentos específicos ou mudanças observadas, como por exemplo: “Eu notei que essa situação está tendo um forte impacto em sua vida e no processo de coaching”.
Depois, tornar a terapia algo normal como mais uma ferramenta que o cliente pode usar para resolver determinada questão/problema. Para isso, deve-se utilizar um discurso engajador, como: “Muitas pessoas talentosas e bem-sucedidas utilizaram a psicoterapia em momentos difíceis durante suas vidas”. Por fim, indicar a terapia dizendo que você gostaria que ele conversasse com um especialista para o seu próprio progresso, perguntando como ele se sente sobre a sugestão e o que acha de discutir os próximos passos.
Enfim, é preciso que o coach tenha sensibilidade e olhar atento para saber onde está errando e de que forma pode contribuir efetivamente para a evolução do coachee. Afinal, esse é um trabalho de parceria, onde coach e coachee são pares.
*CEO da ProFitCoach, Master CoachCertified pela ICF e Sócia-fundadora do Grupo Nikaia
Eliana Dutra, MCC
CEO da ProFitCoach