Todos sabemos que a disponibilidade e mente aberta do coachee e um coach bem preparado que saberá escutar contextualmente e fará as perguntas certas, provocando assim reflexão, é fundamental para o processo de coaching. Contudo, ainda há outro fator que não pode ficar de fora dessa equação: o contrato. E aqui me refiro aquele que vai muito além do papel e das letras miúdas, mais sim o contrato que estabelece a confiança e a transparência entre as partes.
Analisemos, então, a descrição da ICF do item Contratação: “Habilidade de compreender o que é necessário na interação específica de coaching e chegar a um acordo com o novo cliente sobre o processo e relacionamento de coaching”. Esse é o único trecho no qual se comenta sobre a contratação que é necessária a cada sessão, pois se olharmos os outros pontos listados veremos referências relativas a um “contrato guarda-chuva” que aborda apenas questões de processos, como logística, honorários, programação etc. Isso se refere somente ao pré-processo, ou seja, antes do coaching se iniciar de fato. Logo, é possível percebermos que a contratação durante todo o trabalho não está explícita.
Certa vez, fiz mentoria de um coach que não tinha feito nenhum curso acreditado pela ICF e como ele não me trouxe uma gravação, para poder aferir em que nível estava de desenvolvimento me ofereci como coachee. Pela condução do processo ficou claro que ele havia assumido que eu não tinha feito o que devia fazer. Eu querendo discutir como ajudar um parente idoso e ele me perguntava qual o orçamento que eu tinha. Quando para mim, a questão não era o dinheiro, nem quanto dinheiro, e sim a forma de oferecer ajuda sem humilhar, magoar o outro, que eu sabia ser muito sensível a estas questões
Para o coach é importante saber que a contratação não é mera formalidade, o Coach sempre explora o tema que o cliente está trazendo para que o coachee tenha chance de aprofundar e, muitas vezes, descobrir que o tema trazido é só a primeira camada da cebola, e que dentro dela há muito mais cebola.
Durante a sessão deve-se estabelecer:
– A meta que acontecerá fora do encontro, ou seja, aquilo que será a médio e longo prazo;
– O foco da sessão, qual o assunto a ser conversado;
– O resultado esperado do encontro, a curto prazo;
– E como será medido este resultado.
Assim, no meu exemplo do parente idoso, a meta era ajudar a pessoa sem que ele se sentisse humilhado. Isso iria acontecer fora da sessão e o foco descobrir formas de realizar esta ajuda.
Além disso, o coach precisa entender a maneira de aprender do coachee – qual processo que o coachee prefere – isto informará ao coach qual é o caminho que cliente prefere seguir durante a sessão para alcançar o resultado que ele deseja. Por exemplo: o coachee traz como foco da sessão tomar a decisão se compra ou não um cãozinho para seu filho. Se o coach tem uma forma de aprender racional-lógica, isso o levará a sugerir que o coachee liste prós e contras e se o coachee não compartilhar esta forma de aprender irá resistir. Agora, se o coach perguntar qual a forma que você prefere para tomar decisões? O coachee poderia, por exemplo, responder: gostaria de visualizar o futuro com cachorro e sem cachorro, daí não há resistência.
Então, no nível MCC, o coach apoia o cliente para que ele mergulhe no assunto que quer abordar e na meta. Para isso, usa recursos como estabelecer medidas de sucesso, definir vocabulário para assegurar-se que ambos sabem o real tema da conversa e, principalmente, confere frequentemente se o foco dela permanece válido.
Isso porque a contratação não acontece só nos primeiros minutos da sessão, mas sim ao longo de todo o encontro. Logo, ao iniciar a conversa o coach pode perguntar: “o que você quer conversar hoje?”. E esse questionamento pode ser feito novamente no meio da sessão. Por exemplo: “da hora que a gente começou até agora, estamos indo para o lado certo?”, “É isso mesmo que você quer conversar?”. Porque durante o bate-papo muitas vezes o coachee descobre que aquele foco que era o principal no início da sessão mudou e percebe que há outro tópico ainda mais importante, a parte “interior da cebola”.
Então além do contrato formal, no qual serão definidos pontos, como honorários e duração das conversas, a contratação realizada em cada sessão é fundamental para não gerar um incremento na resistência natural do cliente, levando ele a não se entregar ao processo, e fazendo aparecer situações como faltas, atrasos, não cumprimento das tarefas previamente acordadas e até mesmo afirmando que o processo não dará certo. Esse é um sinal claro de que a contratação foi feita de maneira equivocada ou não foi feita. Então, o que fazer nesse caso?
É preciso parar e refazer a contratação imediatamente, esclarecendo quais são as metas do processo e o foco da sessão bem como o resultado que o cliente quer desse foco e qual será o indicador de sucesso que mostrará que esse foco foi bem abordado.
Já quando a contratação possui um patrocinador (empresa), a relação entre o coach e a organização deve estar muito transparente para o coachee. Do contrário a confiança será perdida e, consequentemente, o coaching virará um “teatro”. Logo, o ideal é na reunião de estabelecimento de metas combinar de forma explícita tanto com a empresa quanto com o coachee o que será tratado na sessões e se há algum tema que deve ser deixado de fora, como no caso de uma nova oportunidade de emprego. Dessa forma, todas as partes se sentirão seguras e haverá mais chances de sucesso do processo de coaching.
Diante de toda esta complexidade, é possível percebemos que a contratação em coaching é muito mais do que um simples contrato comercial. Trata-se de conversa que traz confiança, de estabelecer parâmetros e formas de trabalhar e de um olhar atento do coach em questionar e sondar com o coachee o que está sendo abordado em cada sessão ou até mesmo, as vezes, dar um passo atrás para poder seguir em frente.
*CEO da ProFITCoach e MCC pela ICF
Eliana Dutra, MCC
CEO da ProFitCoach